Por Valéria Credidio

No momento em que o Rio Grande do Norte ultrapassa a casa de 50 mortos pela COVID-19, dados demonstram que esse quantitativo poderia variar entre 9 mil e 10 mil óbitos, caso a sociedade potiguar não estivesse em isolamento social. Os dados são demonstrados por meio de modelos matemáticos, construídos pelo professor e pesquisador José Dias do Nascimento, do Departamento de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Essa estimativa é referente ao dia 29 de abril. Há apenas seis dias, o mesmo modelo foi desenhado pelo pesquisador e apontava 2.200 mortes. Ou seja, em menos de uma semana, poderiam ter morrido 7.900 potiguares.

O isolamento social vem sendo aplicado, em todo o mundo, como uma das principais ferramentas de enfrentamento à pandemia. O distanciamento tem por base restringir o trânsito de pessoas nas ruas, com o fechamento do comércio, suspensão das atividades escolares, ficando liberadas apenas a circulação estritamente necessária de pessoas e serviços.

O decreto publicado pelo Governo do Estado do Rio Grande do Norte amplia até 5 de maio o prazo de isolamento social, flexibilizando, no entanto, algumas atividades específicas, como a construção civil, o setor hoteleiro e algumas atividades de higiene pessoal, como barbearias.

No entanto, antes mesmo da flexibilização, a população local não estava cumprindo totalmente com o isolamento social para atingir o que é orientado pelos pesquisadores e autoridades públicas. De acordo com os cientistas, seria necessário um isolamento de 70% da população para que a curva epidemiológica fosse contida, diminuindo o risco de causar um colapso no sistema de saúde.

No Rio Grande do Norte, o índice de isolamento social da população hoje é de 49%, de acordo com monitoramento realizado site Inloco, que atualiza seus dados diariamente.   Segundo o professor e pesquisador da UFRN José Dias, que está na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, o isolamento social garantiu um número mais baixo de óbitos entre a população potiguar. “Se não tivéssemos feito nada e o sistema corresse livre, hoje teríamos mais de 9 mil mortes somente no Rio Grande do Norte”, afirmou.

Para o pesquisador, as medidas de restrição de deslocamento da população foram fundamentais para que esses números não se transformassem em realidade. Ele ainda alerta quanto ao retorno das atividades. “Tivemos o decreto de restrição das escolas que foi uma grande contribuição na queda da curva. Restringir, segurar e isolar de forma extremamente severa faz o processo todo encurtar entre o início e o final, é exatamente essa a grande dificuldade das pessoas entenderem”, complementou o pesquisador.

A importância dos modelos matemáticos
Os modelos matemáticos sempre foram utilizados como ferramentas para gerenciar epidemias. A primeira utilização que se tem registro foi em 1919, com a epidemia da gripe espanhola. A principal função dos modelos é servir como ferramenta diante da inexistência de uma testagem em massa que dê um diagnóstico real e preciso do cenário, assim como a não existência de uma vacina, que possa imunizar a população.

A diferença para o século XXI está no que os pesquisadores chamam de data science, um modelo físico extremamente robusto com aquisição de dados muito ágil. Através desses modelos é possível prever quando a onda epidêmica vai chegar, a intensidade, o fim e os efeitos do isolamento social.

Além do cenário do Rio Grande do Norte, José Dias projetou situações no Ceará, Pernambuco, Bahia e Alagoas a pedido do comitê científico do Nordeste, sob coordenação do neurocientista Miguel Nicolelis.

Conforme esclareceu, o modelo matemático é o principal instrumento para o enfrentamento da pandemia. “Não temos, na maioria dos países, uma testagem massiva que dê um diagnóstico real da situação. A única forma de medida do nível epidêmico é através de modelos, algo já estabelecido na ciência. Na falta de testes, os modelos são uma luz que clareia o futuro na tomada das decisões”.