Por Ion de Andrade, Ricardo Valentim, Pablo Holanda Cardoso
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
As enfermarias de leitos clínicos e os leitos críticos de todo o RN estão repletos de pacientes Covid-19. Entretanto, diferentemente do perfil de ocupação de 2020, no qual a maior parte dos internados era idoso, a metade dos pacientes atuais tem menos de 60 anos.
Em 2020 os não idosos representaram em média 35% a 45% dos internados, conforme mostra o gráfico abaixo:
No gráfico vemos que a linha azul, que representa os pacientes idosos, ao longo de praticamente todo o ano de 2020 permaneceu, em média, acima dos 60% de ocupação. Desde 25 de dezembro passado, que é a data que situa o ponto máximo de ocupação de leitos por idosos, o percentual de não idosos passou a crescer. Atualmente, idosos e não idosos vêm ocupando cerca de 50% dos leitos disponíveis.
A simples alteração nessa proporção não justificaria a explosão de internamentos a que estamos assistindo. O que ocorre é que, não somente as proporções se alteraram, como também o número absoluto de internamentos.
Em 25 de dezembro de 2020, os idosos ocupavam 98 leitos de internamento, contra 173 em 18 de março corrente. Entre os não idosos os números evoluíram de 40 internados em 25 de dezembro passado, contra 161 no dia 18/03/2021, quadruplicando no período. Isso significa que a doença cresceu em números absolutos em todas as faixas etárias, porém de maneira mais expressiva entre os não idosos.
Duas explicações não excludentes são possíveis para esse fenômeno: (a) houve uma superexposição de não idosos nos momentos anteriores à crise atual, (festas de fim de ano, férias, veraneio e carnaval) e ou (b) o vírus se tornou mais patogênico, aumentando o poder de adoecimento de não idosos.
O gráfico abaixo deixa isso claro:
Fonte: Regula RN, março de 2021
O gráfico mostra nas colunas azuis o número absoluto de internados em cada faixa etária em 18 de março no RN. Nas colunas laranja, o gráfico mostra a variação de crescimento ou de redução dos internamentos em cada faixa etária em 18 de março comparativamente à proporção média ocorrida ao longo do ano de 2020.
Vemos que as faixas etárias mais atingidas pelo crescimento da Covid-19 (colunas laranjas) são aquelas situadas entre 20 e 59 anos, com especial impacto nas faixas etárias de 30 a 49 anos onde cresceu: (a) 80,56% entre 30 e 39 anos e (b) 69,23% entre 40 e 49 anos.
As faixas etárias acima de 60 anos mostram uma queda importante de internamentos proporcionais, sendo ainda mais expressiva na faixa etária de 90 anos e mais, (52,32%), possivelmente influenciada pela imunidade vacinal, pois a vacinação desse grupo ocorreu na semana de 22 de fevereiro. Nas demais faixas etárias, devido a uma vacinação ainda recente, ou não realizada, não podemos atribuir o declínio à imunidade vacinal
É de difícil entendimento, portanto, as razões pelas quais os idosos; que comumente são contaminados pela covid-19 em casa, trazida por algum familiar; não foram atingidos pelo crescimento da doença ocorrido entre os mais jovens. Estaria esse recrudescimento entre idosos em curso? Teremos ainda uma escalada entre os idosos nas semanas que antecederão a sua imunidade vacinal definitiva? Não sabemos. Se isso ocorrer sobrecarregará ainda mais o sistema hospitalar.
As crianças, por outro lado, confirmando o que vem sinalizando a Sociedade Brasileira de Pediatria, não são, felizmente, o principal alvo da covid-19 nesse grave momento da pandemia. Do ponto de vista proporcional, os internamentos em crianças tiveram uma redução, a depender da faixa etária, situada entre -36,27% para os bebês e -70,37% para a faixa etária entre 10 e 14 anos. Salientamos o fato de que essa queda proporcional pode se acompanhar de crescimento dos números absolutos, não significando, portanto, que deixe de existir pressão de internamentos mesmo entre crianças, pois essa proporção e declínio proporcional estão sendo medidos num momento de grande disseminação da doença.
O que se vê, portanto, é que os internamentos crescem de maneira substancial nas faixas etárias adultas, mantendo-se estável ou em declínio nas demais.
Lamentavelmente essas são as faixas etárias mais numerosas de nossa população. Isso significa que, ao se difundir nesse grupo etário, a pandemia ganhou uma magnitude sem precedentes, o que explica em parte as elevadas taxas de ocupação dos serviços.
A favor da lógica de uma maior exposição, essas faixas etárias são mais autônomas e não têm a quem prestar contas, diferentemente do que ocorre com os adolescentes e adultos mais jovens.
Há muitas dúvidas ainda sem resposta como a hipótese de que poderia ainda haver um repique explosivo entre os mais idosos antes da consolidação de sua imunidade vacinal. Até aqui a doença sempre agrediu com mais força os mais idosos. Não podemos excluir que essa súbita predileção pelos não idosos seja apenas um momento da pandemia numa dinâmica que venha a nos mostrar, ao término, que a epidemia é ainda a mesma.
De concreto os números nos mostram que todos devem redobrar os cuidados pois todos são alvo, especialmente os adultos e os idosos.
O cumprimento rigoroso das restrições decretadas pelo governo do estado é crucial nesse momento.