Valéria Credidio / Assessoria de comunicação LAIS/UFRN
Da Polônia à Tanzânia, de pessoas em privação de liberdade a crianças com diagnóstico de sífilis congênita ou de microcefalia, da conscientização ao acolhimento de grupos mais vulneráveis, de um equipamento que facilite o diagnóstico da osteoporose a ações efetivas para a melhoria da qualidade de vida de pessoas com esclerose lateral amiotrófica, também conhecida como ELA, essa é a trajetória que o Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS/UFRN) vem traçando ao longo de sua história não só com o desenvolvimento de tecnologias inovadoras mas também com um olhar para a necessidade humana. As cooperações internacionais são fundamentais para impulsionar esse trabalho.
Na Polônia, a ação internacional mais recente, a equipe da base de Audição e Linguagem, coordenada pela professora Sheila Balen, atendeu a aproximadamente 500 pessoas em conjunto com a equipe da professora King Chung, da Northern Illinois University, de Chicago, em uma atividade que também envolveu a Jagiellonian University, da cidade polonesa de Cracóvia. A articulação resultou em um atendimento de audiologia humanitária, proporcionando testes auditivos a crianças em idade escolar, integrantes da comunidade judaica e refugiados ucranianos que estão abrigados em território polonês.
Esse tipo de cooperação é de extrema importância porque a grande maioria dessas pessoas não teria acesso aos testes, fundamentais para identificar qualquer problema que possa interferir no aprendizado infantil, por exemplo. A testagem também é importante para os adultos que foram prejudicados ou até mesmo perderam a audição por conta do impacto de bombas, consequência dos ataques russos à Ucrânia.
No continente africano, as ações do LAIS também resultaram em transformações para a comunidade. A partir das ações do brasileiro Rafael Silva, missionário voluntário da Jocum – Jovens com uma Missão –, pesquisadores do LAIS se deslocaram até Morogoro, no interior da Tanzânia, a fim de conhecer a realidade do povo e a necessidade local e, a partir dessas informações, produzir cursos de formação de agentes voluntários em saúde. O recurso educacional aberto está disponível no Ambiente Virtual de Aprendizagem do Sistema Único de Saúde (AVASUS) em três idiomas, entre eles, o swahili, idioma mais falado da Tanzânia. Para Rafael Silva, a educação em saúde tem o poder de transformar a realidade das comunidades mais vulneráveis, por meio do desenvolvimento de novos recursos e tecnologias. “Esse é o caminho para mudar a vida das pessoas”, argumentou. Todo o trabalho desenvolvido pela equipe do LAIS está descrito no documentário “Olhares” (https://www.youtube.com/watch?v=IQJm_t17aj0&t=2s), sob a direção de Kaline Sampaio.
Projetos Sociais
Como forma de enfrentamento a um dos principais problemas sociais, o atendimento de pessoas em privação de liberdade, está à disposição no Ambiente Virtual de Aprendizagem do Sistema Único de Saúde (AVASUS) uma trilha de aprendizagem de autoria de um grupo de pesquisadores do LAIS e composta por módulos autoinstrucionais pensados para a promoção do conhecimento integrado e acessível para a formação humana em saúde. Em pouco mais de dez meses no ar, já foram contabilizados por volta de 19 mil cursistas.
De acordo com Janaína Rodrigues Valentim, uma das autoras, o recurso é inédito no Brasil e também no mundo, possibilitando a formação da pessoa privada de liberdade, do policial penal e dos profissionais de saúde e gestores que atuam no ambiente prisional. “A trilha de aprendizagem ‘Além dos Muros’ foi toda pensada para promover a educação em saúde com um olhar humanitário de proteção dos direitos humanos, trazendo questões que são garantias dos privados de liberdade. Os resultados já são promissores, uma vez que foram observadas mudanças nos processos de trabalho no contexto da saúde prisional em todo Brasil, e isso foi percebido na ampliação dos diagnósticos dos agravos mais prevalentes nos presídios, por exemplo, a Sífilis e o HIV”, argumentou a pesquisadora.
Em sua concepção, a trilha formativa leva em conta os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS), preconizados pela Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas (ONU). Assim, todo o trabalho desenvolvido não tem foco apenas no interior dos presídios mas também abrange toda a sociedade. Para o diretor executivo do LAIS, Ricardo Valentim, a publicação do artigo “A Relevância da Educação Massiva em Saúde no Sistema Prisional Brasileiro: O Curso ‘Atenção à Saúde para Pessoas Privadas de Liberdade’ e Seus Impactos”, na Frontiers in Public Health, reforça esse aspecto, demonstrando o impacto da formação em saúde para a transformação social e para a indução de resiliência do nosso sistema de saúde, o SUS. “Cuidar da saúde do presidiário é também cuidar da saúde da comunidade”, enfatizou.
No tocante ao enfrentamento à sífilis, diversas ações foram realizadas com populações-chave, como a comunidade LGBT+, atendida a partir de eventos direcionados à conscientização quanto à prevenção, à testagem e ao tratamento da sífilis. Dentre os eventos, destacam-se a Feira da Diversidade e a Parada LGBT+, de São Paulo, que reuniram mais de quatro milhões de pessoas. O LAIS também esteve presente na Parada do Orgulho na cidade de Ribeirão Preto, no interior paulista. No mesmo município, a convite da ONG Arco-Íris, pesquisadores do Projeto “Sífilis Não” participaram de uma roda de conversa com mais de 100 estudantes e professores de uma escola pública local. A abordagem foi direcionada para a prevenção, a testagem e o tratamento da sífilis. A presença em eventos como esses fortalece as ações do Projeto “Sífilis Não”, que vem sendo colocado em prática desde 2018, em uma parceria entre o LAIS, o Ministério da Saúde e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
Ainda no Projeto “Sífilis Não”, diversas ações foram colocadas em prática com a população em situação de rua. Em Fortaleza, por exemplo, o trabalho realizado pelos apoiadores do projeto conseguiu fazer com que o teste rápido fosse feito nessa população, que não costuma frequentar as unidades de saúde básica.
Para colocar as ações em prática, diversas parcerias com a comunidade foram firmadas. Uma delas com a Casa da Sopa, instituição filantrópica que distribui alimentação para pessoas em situação de rua. “O projeto foi fundamental para propiciar a testagem dessas pessoas e, assim, fazer o tratamento adequado”, ressaltou Leonardo Rodrigues, representante da Casa da Sopa. Esses e outros resultados obtidos pelo Projeto “Sífilis Não” podem ser conferidos na websérie “Um passo à frente” (https://www.youtube.com/watch?v=SjpFPZ0R58Y&list=PL0umkFOKSOyQODkWbhF-YDOV4kIqN1ZdM&index=2), produzido pela equipe de comunicação do LAIS.
Reconhecimento
Diante de todas essas ações, o reconhecimento da sociedade veio por meio da entrega de duas condecorações. Uma delas é a Comenda Mery Medeiros para Defensores e Defensoras dos Direitos Humanos, organizada pela Secretaria Estadual das Mulheres, Juventude, Igualdade Racial e Direitos Humanos (SEMJIDH) em conjunto com o Conselho Estadual de Direitos Humanos e Cidadania (COEDHUCI). O Laboratório foi homenageado na categoria Educação em Direitos Humanos.
A outra homenagem foi o Prêmio Josean Rodrigues de Direitos Humanos LGBT 2022, promovido pela Rede Gay, no Rio Grande do Norte. Para o diretor executivo do LAIS, professor Ricardo Valentim, todas essas homenagens reforçam a responsabilidade do trabalho realizado por todos os pesquisadores que integram o Laboratório, com a indução de políticas públicas direcionadas para a equidade e a justiça social. “A ciência que promove impacto social, entrega algo de valor. Esse é o verdadeiro papel da ciência. A ciência tem que servir aos propósitos da sociedade”, argumentou.
Ainda em 2022, outra homenagem importante veio com o Troféu Diversidade, entregue pela Arco-Íris e a Rede Gay do Brasil. Para o representante das duas instituições, Fábio de Jesus, as ações do projeto “Sífilis Não” são fundamentais na promoção do cuidado para a população LGBT+. “Nós precisamos de diagnósticos e tratamento, e, com iniciativas como esta, tenho certeza que vamos vencer. Por isso, é importante contarmos com parceiros como o LAIS”.